O Projeto de Memória “TRF5 – Semeando o Futuro” tem História…
Por: Eliana Rezende Bethancourt
Um Projeto de Memória dentro de qualquer instituição necessita ser pensado de forma a atender diferentes demandas.
Em primeiro lugar, devemos nos perguntar para quê e porquê de um Projeto de Memória.
Isto por que um Projeto de Memória não pode se resumir à coleta de depoimentos e uma Linha do Tempo.
Pensado em sua forma mais abrangente um Projeto de Memória Institucional visa fixar, preservar e divulgar a História de uma instituição, ao mesmo tempo em que reúne, organiza e disponibiliza fontes e informações contidas nos documentos reunidos ou produzidos por ela.
Além disso, a Memória Institucional inscreve-se no território do fortalecimento de Identidade e da Cultura Organizacional através da valorização de seu Capital Intelectual (recursos intangíveis que habitam a capacidade de cada indivíduo que faz parte da instituição).
Quando uma organização reconhece a importância de tudo isso podemos dizer que é uma instituição madura e que possui apreço pelo que denominamos Responsabilidade Histórica, ou seja, um conjunto de valores e preocupações com o que se produz hoje e que deverá ser preservado para as gerações futuras. Pensar em um Projeto de Memória não significa apenas valorizar o passado, mas também significa a conscientização que temos uma responsabilidade com o que deixaremos de herança para o futuro.
A assessoria técnica para o Projeto de Memória “TRF5 – Semeando o Futuro” , a partir do trabalho com o Programa Estágio de Nível Médio, mostrou ser uma excelente oportunidade de, através de uma experiência muito localizada (jovens carentes tendo a oportunidade de ser inseridos no mercado de trabalho), abordar de que forma a Memória destes ex-estagiários conferia ao Tribunal uma Identidade muito própria.
Pensou-se imediatamente no tripé que sustenta uma organização: o que diz sobre si, o que faz e o que outros dizem e/ou acham dela. Este conjunto de ser e fazer auxilia na construção do que chamamos Imagem e Identidade. Se a imagem é aquilo que projetamos, a Identidade é a nossa essência, é aquilo que somos. Para uma organização é aquilo que a diferencia de todas as demais, que lhe dá credibilidade, respeito e a torna absolutamente única.
O Projeto de Memória Institucional neste sentido, auxilia neste caminho de apresentar a todos o que de fato a instituição é e faz. Por isso, cala tão fundo e fornece a possibilidade de vincar a identidade e cultura organizacional nos ambientes internos e projeta uma imagem aos que estão fora coerente com seus valores e missão.
A partir de uma Identidade bem vincada, a Memória Institucional se alternará com o Tempo e se modificará a partir de demandas do presente, exigências do futuro e das relações desta instituição com seu meio social, cultural, político, econômico. A gama de todas estas variáveis é dada pelo que chamamos de Cultura Organizacional. Algo profundo que permeia ações, modos de estar e se relacionar.
Mas temos que ter cuidado! Memória Institucional não se resume à memória de guarda documental ou coleção de curiosidades e historias peculiares, ou objetos ditos de museus. Acreditar e praticar isso significa absolutamente não compreender o que seja este trabalho que necessita, e muito, do diálogo interdisciplinar e com práticas metodológicas muito específicas. Não há receitas prontas e usar fórmulas de terceiros não trará o que de fato se espera de todo este trabalho.
Neste sentido, quando falamos em Memória Institucional estamos falando de um conjunto de experiências que, reunidas, dão a dimensão e os contornos da evolução da instituição no tempo e no espaço. Reforçamos a noção de que a Memória Institucional não pretende ser a reconstituição de algo que não existe mais, mas o seu contrário: pretende ser a Identidade do que o Tempo e a experiência de todos trouxeram à Instituição.
É a História viva que se constitui dia-a-dia.
DESAFIOS
Exposto os pressupostos sobre os quais a Memória Institucional se pauta, entramos no campo dos diferentes desafios que o Projeto Memória oferecia.
Em 1º lugar, tínhamos um Programa Estágio de Nível Médio que havia durado 24 anos, atingido um universo de quase 1.000 estagiários e impactado todos os setores e servidores do Tribunal, bem como as famílias destes jovens, já que era um Programa eminentemente socioeducativo e inclusivo.
No decurso de todo este tempo produziu uma grande quantidade de documentos em diferentes suportes (fotografias, audiovisuais, textuais), os quais sofreram uma grande transformação tecnológica no mesmo período (1997-2021), gerando em alguns casos, deterioração de objetos (caso de fotografias e alguns tipos de mídias) ou mesmo a obsolescência tecnológica propriamente dita.
O ciclo de vida de entrada e saída destes jovens no Programa Estágio de Nível Médio era de dois anos, e a cada semestre várias dezenas de jovens entravam e saíam com o termino de contratos e a chegada de novos beneficiados.
Ou seja, era necessário fazer um recorte dentro do período de 24 anos que comportasse as diferentes experiências que estes jovens eram submetidos. A dinâmica do Programa oferecia por si só vários elementos a ser identificados para integrar ou não o trabalho de Memória Institucional.
Após estas opções que são metodológicas e que serão descritas abaixo, houveram outras decisões sobre questões relacionadas ao que se esperava deste Projeto de Memória e de decidir sobre qual a melhor forma de dar acesso à toda informação reunida. Organizar para disponibilizar foi uma ação desafiadora e que necessitou de muitos braços. Aqui um agradecimento imenso à Sonia Paes e seu fiel escudeiro Rodrigo Souza Alves que digitalizaram e organizaram em anos boa parte da documentação existente no Tribunal referente ao Programa Estágio de Nível Médio (reportagens, fotografias, documentos, entre outros).
E aqui entra o outro grande desafio: teríamos apenas 3 meses para fazer toda a parte relativa à coleta de depoimentos e triagem da documentação a ser utilizada.
Seriam 3 meses para desenvolver e concluir um Projeto de Memória que exigiria da Assessoria Técnica do Projeto de Memória trabalhos de Pesquisa Histórica, Curadoria de Informação, Curadoria de Conteúdos, Arquitetura de Informação, Design de Informação. Atividades que longe de serem conexas, necessitavam de um olhar próprio e voltado para o objetivo maior que era a Memória do Programa de Estágio Nível Médio do TRF5.
É óbvio que um trabalho com todos estes desafios, necessitaria de uma metodologia bem estruturada e robusta para propiciar alcançar todos objetivos que nos dispomos.
Abaixo estão discriminadas algumas decisões metodológicas fundamentais que foram determinantes para o cumprimento dos objetos e prazos do Projeto de Memória “TRF5 – Semeando o Futuro: Memória do Programa Estágio de Nível Médio”
METODOLOGIA
Em primeiro lugar, necessitávamos circunscrever um Programa de 24 anos de existência, um universo de beneficiados de quase 1.000 adolescentes em um Projeto de Memória que deveria durar no máximo 3 meses. E mais, além de lidar com toda a documentação já reunida, deveríamos produzir outras: cessões de direitos de uso de imagem e vídeo, localização e contato com eventuais depoentes, coleta de depoimentos, processamento técnico de toda a documentação para que pudesse ser sistematizada e organizada a ponto de fornecer matéria-prima para os trabalhos de Curadoria de Conteúdos, Arquitetura de Informação, Design de Informação e a produção de textos a partir da Pesquisa Histórica.
Com tais métricas ficou absolutamente claro que teríamos que abrir mão de algumas coisas. Seria ingenuidade achar que conseguiríamos fazer um bom trabalho abarcando tudo de uma só vez. Assim, optamos por trabalhar com o conceito de amostragem e saímos em busca de contatos com os ex-estagiários. O objetivo era alcançar pelo menos 10% deles. O que significaria um universo de 100 ex-estagiários, bem como autoridades e apoiadores do Programa Socioeducativo.
Algumas dificuldades logo surgiram: os telefones e contatos de muitos estavam desatualizados e a busca seguiu-se por redes sociais. Especialmente no caso dos mais antigos, era bem mais difícil o acesso do que com os mais jovens, já que o uso de redes nos primeiros tempos era bem restrito.
Mas conseguimos chegar ao número desejado, e a partir daí começamos a solicitar depoimentos escritos e aos que tivessem agenda, o depoimento oral ao vivo via plataforma de webconferência.
Os tempos de COVID19 trouxeram esta facilidade e assim conseguimos criar várias sessões de Rodas de Conversa, Cirandas de Roda e Rodas com Autoridades para falarmos sobre a experiência do estágio de nível médio. Foram encontros de emoção, alegria e partilha muito ricos.
Para a coleta de depoimentos, não abandonamos de forma alguma métodos e técnicas necessárias aos mesmos. Não tínhamos como objetivo realizar um interrogatório ou uma entrevista. O respeito à Memória e a forma como esta se manifesta foram rigorosamente cumpridos, além de conduzir o depoimento de modo a não sofrer interrupções ou influência de terceiros. Um desafio e tanto, já que em geral, depoimentos devem ser feitos individualmente. Para os que se interessam pelo tema, sugiro a leitura do artigo: “História Oral: o que é? para que serve? como se faz?”.
Para conferir o resultado deste trabalho clique na página Depoimentos.
Ao mesmo tempo, era preciso lidar com o trabalho de Curadoria de Informação e posteriormente de Curadoria de Conteúdos a partir de toda a documentação levantada e guardada sobre o Programa Estágio de Nível Médio. Mas foi exatamente o trabalho de Curadoria e Pesquisa Histórica que permitiram encontrar uma narrativa que pudesse ser aplicada ao que seria o produto final do trabalho: o Design e Arquitetura de Informação para um site comemorativo.
E assim se deu…